quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

Base masculina


Passei a ir à manicure nos últimos meses. Não tenho periodicidade definida nem local de preferência. Quando acho que devo fazer a unha, procuro um lugar perto de casa ou de onde esteja no momento. Na última vez, fui a um salão especializado em mão, pé e depilação no Shopping Morumbi. Paguei vintão. E, além das unhas das mãos, resolvi também fazer um dos meus discursos anticasamento.

Só tinha mulher no lugar. Aproveitei que uma manicure – morena de cabelos encaracolados pintados de louro, na faixa dos vinte cinco anos, gorda e com cara de carente - tocou no assunto e lancei minhas teses. Falei que elas deveriam esquecer a história de casamento. Mas, se por acaso elas não resistissem e acabassem indo morar com alguém, que não tivessem a expectativa de que seria para a vida toda.

A mulata que fazia minhas unhas me olhou feio. Franziu o rosto magro e com rugas ao redor dos olhos – parecia a mais velha das funcionárias, perto dos cinquenta, imagino – e falou: “Mas como? Eu já tô casada há mais de dez anos”.

Respondi o óbvio: “Então tá na hora de separar”. Fiquei esperando a manicure não apenas arrancar um bife. Achei que ela fosse arrancar todos os meus dedos. Mas ela não fez isso. Levantou-se dizendo que precisava pegar um vidrinho de base masculina, que estava em falta mesa dela.

Continuei falando. Preguei o desfrute da liberdade de se relacionar com várias pessoas. Que dormir e acordar com a mesma pessoa durante anos e anos é um tédio. Mais ainda: os velhos são cada vez mais saudáveis e independentes. Portanto, já caiu a ideia de que a pessoa necessita de um parceiro na velhice. Bobagem. Há amigos, parentes, colegas, amantes e outras companhias para idosos. A gorda que puxou o assunto do casamento disse que fazia sentido. Só que deu o argumento clássico das mulheres: “É que a gente ainda é criada na expectativa de casar”.

Ouvi um som vindo de atrás da minha posição. Olhei para trás. Uma japa magra bronzeada - de saia curta preta e batinha cinza - fazia mãos e pés. Esmalte cor de amora tanto nos dedos de cima quanto nos de baixo. Ela comentou com as funcionárias que a atendiam: “Vou casar daqui a oito meses”. Ouvi. E emendei: “Ainda dá pra desistir”. O pessoal riu. Menos a minha manicure, que já tinha voltado e estava passando a base nos meus dedos. A japa não disse nada. A expressão facial dela não demonstrou irritação. Droga. Sou um psicopata verbal. Tenho prazer quando minhas palavras afetam as pessoas.

Na hora de pagar, perguntei se a moça do caixa – uma gordona, daquelas de cara bem redonda – era casada. Ela disse que sim. Lamentei. Até que fui educado. Eu deveria ter dito que no caso dela casamento é cabível. Ela não estava capacitada para arrumar muitos parceiros.

A manicure mulata que me atendeu continuou olhando feio pra mim na saída. É que eu não dei gorjeta.