terça-feira, 25 de maio de 2010

Sentimentos coletivos

Gosto muito de futebol. Só que não me empolgo com Copa do Mundo. Curto os jogos. Fico ligado nos confrontos entre as principais seleções e jogadores. Mas o clima de patriotismo em torno da Seleção Brasileira me chateia.

Sou um tipo refratário a nacionalismo, ideologia e religião. E só me interesso por sentimentos e características individuais. Acho aborrecida essa coisa de falar em dor e alegria coletivas decorrentes de derrotas e vitórias de uma equipe de futebol.

Exemplo. Toda vez que há um jogo entre Brasil e Uruguai, muitos programas e comentaristas esportivos lembram a derrota brasileira por 2 a 1 na final de Copa do Brasil, em de 1950. Ouvi um dos analistas, Carlos Eduardo Lino, do canal fechado Sportv, que aparenta ter nascido bem depois de 1950, chegou a dizer que é uma dor que passa de geração para geração. Como assim? Não tenho nada que ver com aquilo.

Não consigo entender como sentimentos, sejam de que tipo for, possam ser transferidos. Cada pessoa reage de forma diferente perante aos acontecimentos que vivenciam. Tem gente vive um período de luto de forma calada. Outro sujeito se abala profundamente e entra em depressão. Mas um terceiro resolve se envolver em diversas atividades, para ocupar a cabeça e esquecer a perda.

Uns combatem numa guerra ou são vítimas de sequestro e acabam por desenvolver um quadro de Transtorno de Estresse Pós-Traumático. Outros, não.

Por isso que também me incomoda o papo sobre o sofrimento vivido por povos. Não tenho mais saco para o Holocausto, por exemplo. Claro que foi terrível. Muitos judeus foram alvos de grandes atrocidades. Só que os judeus que conheço – que não foram vítimas do Holocausto – não estão presos ao que aconteceu no período nazista na Alemanha. Estão aí tocando suas vidas, plenamente integrados aos contextos sociais e profissionais nos quais estão inseridos hoje.

Um executivo judeu que conheço está preocupado com os resultados da empresa ou área que gerencia, não com os campos de concentração. Ele vive em outro tempo. Pode até ter ouvido seus avós contarem histórias sobre o Holocausto, mas não dá para dizer que esta pessoa de 30 e poucos anos tem a marca do suplício imposto a muitos judeus no regime de Hitler. Não sei de nenhum judeu nascido após a Segunda Guerra que esteja emocionalmente travado nos dias atuais por conta do Holocausto.

Voltando ao futebol. Não faz sentido colocar todo mundo na mesma trip. Há sim gente que se abala com uma derrota da Seleção Brasileira em Copa do Mundo. Mas existem os que não ligam. Mais ainda: algumas pessoas não gostam de futebol, não embarcam na onda de patriotismo e detestam o período de Copa.

Ouvi um relato de uma mulher que saiu para a passear com o cachorro enquanto o Brasil jogava e ganhava da Alemanha na final do Mundial de 2002, disputado na Coreia e no Japão. Não dá para dizer que alguém assim vai sentir a dor de perder a final da Copa de 2010 para a Argentina, caso isso ocorra.

Não sou fã de coisas que levam o rótulo de coletivo. Pior ainda quando se trata de sentimentos. É inadequado. Impreciso. Além de brega, é claro. Muito kitsch esse lance de pátria de chuteiras.

Pensão moralista

Querem agora regular as relações afetivas e sexuais entre as pessoas. Tramita no Congresso Nacional brasileiro um projeto de lei que diz o seguinte: amante que se tornar pivô de uma separação conjugal terá de pagar a pensão alimentícia da pessoa casada com quem se relacionou. Sim, esposa ou marido traído ficará livre de sustentar a ex.

O conceito do projeto de lei é reacionário. Acaba por reinstituir o adultério como crime. Não duvido que apareça algum moralista hidrófobo defendendo punição até maior para o cônjuge traidor e o amante.

Acontece que se o tal projeto se transformar em lei não terá eficácia. As pessoas não deixarão de viver relações fora do casamento por conta desta possível sanção financeira. Por mais que mexer no bolso seja um grande elemento de dissuasão, os afetos e o sexo são mais complexos que isso.

Mais: o projeto é também retrógrado ir na direção contrária à tendência atual de maior diversidade de relacionamentos. As pessoas casam e descasam com mais facilidade. Foram tomadas medidas que deram mais celeridade nos processos de divórcio.

Outra coisa. Traição e fidelidade sexual são conceitos que se tornarão obsoletos. É uma questão de direitos civis. Cada um que se vire seus sentimentos e desejos.

Defendo que a possibilidade do cônjuge se engraçar com outras pessoas faça parte dos riscos envolvidos em um casamento. Assim como quem faz uma aplicação financeira pode perder a grana.

Há também casos de pedido de indenização por danos morais em virtude de infidelidade conjugal. Outro retrocesso. Mais uma impropriedade.

Exemplo: alguém que é demitido e trocado por outro funcionário em uma empresa pode ficar mal. Talvez necessite de tratamento psicológico. Mas ela não pode requerer uma indenização por danos morais contra o empregador. O dispensado receberá o que observam as leis trabalhistas.

Pior ainda é punir o amante. Se não respeitar a exclusividade sexual caracteriza quebra de contrato, quem descumpriu a cláusula foi o cônjuge que arrumou um caso. Ele que se vire com o marido ou a esposa. O amante tem de ficar fora disso.

Quer dizer então que se eu deixar de pagar prestações de um automóvel para quitar uma dívida imobiliária, quem me vendeu o apartamento vai ter de ressarcir o banco – traído por mim ao deixar de realizar o pagamento - que financiou meu carro? É melhor não dar ideia.

A regulamentação do casamento tem a ver com família, não com sexo. Serve para estabelecer parâmetros sobre construção e divisão patrimonial. Assim como responsabilidades com filhos menores de idade, caso eles existam. Fora isso, ninguém é de ninguém.