domingo, 28 de dezembro de 2008

Consumo é tudo

Espiritualistas, esquerdistas, românticos e idealistas dizem que no mundo atual as coisas estão invertidas. Reclamam que na contemporaneidade é mais valorizado ter do que ser. Como defendo o pragmatismo, só posso dizer o óbvio: não dá para ser em ter.

O sujeito expressa o que é pelo consumo. Preciso das minhas calças jeans mais justas e das minhas camisas e camisetas - também mais apertadas - para me diferenciar dos manos. Tenho de comprar carne para dizer que não sou vegetariano. Necessito dos meus cosméticos para me mostrar como metrossexual.

Gosto muito de comprar. Tanto que se alguém me pergunta “O que você quer ganhar?”, respondo: “Dinheiro”. Não tem presente melhor que grana. Assim eu posso ir a uma loja escolher o que quero e passar no caixa. Tenho prazer em assinar o comprovante do cartão de crédito. Assim como em digitar a senha do cartão de débito. Muitas vezes, quando compro roupas e sapatos, já saio usando as peças novas.

E atualmente há uma variedade de produtos e serviços. De várias partes do mundo. Quem se esquenta com isso é pobre ou tem mau gosto estético.

quinta-feira, 25 de dezembro de 2008

Insensibilidade educativa

Passei a noite de Natal na casa de uma tia. Havia quatro velhotas: minha tia dona da casa, minha mãe e outras duas tias solteironas. Todas com 70 anos ou mais. E mais dois casais - meu primo e minha prima com seus respectivos cônjuges - com filhos. Duas crianças. Uma de cinco anos e outra de um ano e alguma coisa.

Tédio total. Só valeu pela torta holandesa de sobremesa. Minha tia dona da casa e a nora dela são muito boas na cozinha. A partir de amanhã, dia 26 de dezembro, vou tratar de queimar na esteira as duas fatias que comi.

O pior foi ter de aturar as crianças com seus presentes. O menino de cinco anos ganhou uns 10. Mais de metade eram carrinhos. O que ele mais gostou foi um de controle remoto, um tipo Mitsubishi Pajero - branco, cheio de adesivos - de rally. O moleque chato resolveu brincar com o carrinho na sala. É um apartamento grande, com um corredor de entrada razoavelmente grande. Mas as velhinhas ficavam "Vem cá mostrar o carrinho novo".

E o garoto aproveitou. O carrinho cruzava a sala batendo nos sofás, poltronas, cadeiras e na mesa de jantar. O menino gritava "Olha, bateu!". O que mais me chateiam nas crianças é que elas tornam os adultos mais infantis que elas. Principalmente, as mais velhas. Minhas tias e minha mãe repetia tudo que o molequinho falava. Ele dizia "O farol acende" e as quatro faziam eco "O farol acende". Os pais do guri aproveitaram para descansar dele, uma vez que tinham quatro babás à disposição naquele momento. Os responsáveis pela menina de um ano e pouco cuidavam da garotinha. E eu torcia para aquele carrinho se chocar fortemente com um pé de cadeira ou de mesa e quebrar. Talvez teria de tolerar um pouco de choro do menino, mas logo ele pegaria outro dos brinquedos que ganhou e esqueceria.

Mas a coisa só piorou. O menino exigiu que todos que estavam sentados nos três sofás e nas poltronas levantassem as pernas para o carrinho dele passar. O brinquedo circulava e as tiazonas continuam repetindo as falas do moleque. Agora o coro era de "Ehhh!".

Resolvi resistir. Não levantei minhas pernas. E ainda falei para o garoto: "Vai ter de manobrar seu carrinho". Tem mais. Eu disse que não queria o brinquedo batendo nos meus pés. Além de incomodar, estragaria meus mocassins novos cor café. As velhas diziam "Brinca com ele, Marcelo". Respondi: "Não. Ele que aprenda a mexer nesse carrinho e contorne meu pé".

O moleque não é trouxa nem ingênuo quanto pensam a avó, as tias e os pais. Ele procurou manobrar o carrinho. Deu umas batidas no meu pé esquerdo. De leve. Chamei a atenção dele. O guri deu ré no Mitsubishi, que bateu na base da cadeira de balanço da avó dele.

Depois de algumas tentativas, o molequinho desistiu. Pegou o carrinho com a meu esquerda - o controle estava na direita -, levantou o brinquedo e foi brincar no espaçoso corredor de entrada.

Estou pensando em abrir uma pré-escola.

quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

Meu Natal inesquecível

Texto de dezembro de 2005.


MATEI O PAPAI NOEL



Este será o Natal mais feliz da minha vida. Realizei algo que tinha vontade de fazer desde criança. Matei o Papai Noel. Infelizmente, apenas um Papai Noel de brinquedo. Quem sabe no próximo Natal eu consigo eliminar um Papai Noel mesmo. Não apareça de vermelho e branco na minha frente em dezembro de 2006.

Como o Papai Noel antigo da minha casa está quebrado – não toca mais "Jingle Bells" -, comprei um especialmente para assiná-lo. E não foi de camelô. Eu queria matar um Papai Noel de qualidade. Paguei cinqüenta paus por um Papai Noel em uma loja de presentes. Aproveitei e comprei pilhas novas. Para ter de reserva, evidentemente. O plano não poderia falhar. Senão, eu voltaria a entrar em depressão.

Moro no décimo primeiro andar. Fui até a sacada com o Papai Noel já ligado – tocando "Jingle Bells". Joguei o brinquedo para cima. Fiz isso para ver o Bom Velhinho cair girando. Foi uma experiência fantástica. Tentei contar quantos giros o Papai Noel deu até chegar ao solo. Claro que não consegui. Vibrei enquanto olhava a alternância das solas pretas das botas e do gorro vermelho. Solas e gorro. Solas e gorro. Solas e gorro. Solas e gorro. Até que me perdi. Deu para ver também os óculos dele se soltarem. O Papai Noel não era tão bom quanto eu imaginava. A coreana da loja de presentes me engambelou.Tã-tã-tã-ta-t... o som de "Jingle Bells" – a música mais irritante que já escutei – enfraquecia. E eu extasiado.

Paf! O Papai Noel espatifou no chão cimentado da quadra do meu prédio. Três moradoras aparecerem em suas sacadas para ver o que tinha acontecido. Pena que nenhuma conseguiu verificar que se tratava do cruel assassínio do Bom Velhinho. Uma velha do quarto andar olhava atentamente. Mas parecia que não entendia nada. Acho que ela já está caduca e cega. Uma mulher do décimo do outro bloco também não visualizou que objeto tinha caído na quadra. Tem um árvore colossal à frente da sacada dela. Uma empregada do sexto – do outro bloco – saiu e logo entrou de volta no apartamento. Não deve ter visto nada. O problema é que eu matei o Papai Noel à tarde. Devia ter feito isto à noite. Certamente, mais gente poderia assistir ao meu espetáculo.

Da minha sacada, contei seis grandes partes do Papai Noel que se desprenderam depois do choque. Desci para constatar a morte do Papai Noel e conferir de perto o estrago. Quase gozei quando vi a cena do crime. O cabeça parou perto da trave de futsal. O tronco na marca do pênalti. Um braço estava junto à tela de proteção. O outro dentro do gol. Uma perna estava à esquerda, quase em cima da linha de fundo. A outra acabou do lado contrário, também próxima à linha de fundo da quadra. O saco estava dentro do gol. Não encontrei os óculos do Bom Velhinho. Queria guardá-los como troféu pela minha façanha de ter estraçalhado o Papai Noel. Fiquei com o saco.

Chegaram o zelador e um faxineiro. O zelador falou: "Rapaz, tacaram um Papai Noel lá de cima. O bicho torô todinho". Assumi, orgulhosamente, minha culpa. Declarei na lata: "Fui eu que joguei". O zelador: "Por que você fez isso, são-paulino?". Fui enfático: "Deu vontade, porra!". Enquanto recolhia os restos mortais do Papai Noel, o faxineiro disse: "Eu queria dar um Papai Noel desse para a minha filha". Não resisti e soltei: "O Papai Noel morreu. Sorte da sua filha". E fui embora. Acho que eles não contarão que sou o responsável pelo fim do Papai Noel. Meu pai é o sub-síndico do prédio. Além disso, sou morador antigo. Mudei-me para cá com seis e agora estou com vinte e nove. Por causa disso, os funcionários não têm apenas respeito, como também medo de mim. É excitante provocar medo nos outros.

Chega de Natal e de Ano Novo. Em vez de ficar bonzinho, fico mais azedo ainda neste período. Não mando cartões nem e-mails de Boas Festas. Não dou presentes. Só recebo, é claro. Não dou gratificação para entregadores de jornais e revistas. Pago as assinaturas. E o preço delas já embutem o serviço de entrega. Acho chato que eles não tenham dinheiro para comprar um panetone. Só que isso não é problema meu. Também me falta grana para adquirir muitas coisas. Acho um absurdo contribuir para a caixinha dos funcionários do meu condomínio. Eles são empregados formais. Recebem em dia. Levam cestas básicas todos os meses. Mais ainda: acabaram de embolsar o décimo terceiro salário. Dá para comprar panettone e o Papai Noel de brinquedo para os filhos.

O Papai Noel morreu. Assim como Deus também deveria estar definitivamente morto.

Anti-Festas

As Festas de fim de ano são o período mais entediantes para mim. Detesto mensagens de esperança. Não tenho saco para aquelas conversas de muita paz e alegria. Pior ainda é quando desejam "muita luz". Se bem que é necessário mesmo muita luz. Sem ela não posso usar computador, televisão e microondas.

Como rejeito qualquer forma de moralismo, não vejo nenhuma obrigação moral de desejar um mundo melhor. Até porque considero a idéia de um mundo melhor uma tremenda ingenuidade.

Seres humanos fazem coisas sem saber por que as fazem. Não há transcendência. Bondade e maldade são categorias criadas pelos seres humanos, não por uma força superior. Os que acreditam num além já devem se dar por satisfeitos pelo fato de muitos humanos conseguirem frear seus desejos. Gente é criativa e destrutiva. E aceito isto numa boa.
Tá, muitas pessoas entendem que precisam de sentido para a vida. Sentido só me interessa na comunicação. Tenho de ser claro quando falo e escrevo. De resto, acontece e pronto.

A única coisa boa das Festas é que dá muita chance de tirar sarro dos sensíveis.

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Carta ao leitor

O Insensível não terá nenhuma condescendência com sentimentalismo. Vai debochar de romantismo e idealismo. Irá satirizar minorias. Questionará e depreciará religiões, sacerdotes e fiéis. Espiritualismo, misticismo e crendice serão bombardeados. Vai ser arrasador com animais e donos de animais de estimação. Tratará com ironia e sarcasmo crianças e pais. Vai tirar sarro de relacionamentos afetivos. Pegará no pé encardido de bichos-grilos contemporâneos.

O Insensível é liberal. Começa sendo liberal nos costumes e na cultura. Vai descer a lenha no conservadorismo moral. O blog também é liberal em política e economia. As ingenuidades de esquerda serão bastante atacadas nesta publicação digital.

O blog terá um edição temática por semana. Exemplo: Por que não ter filhos. Trará artigos, comentários e crítica de livros, filmes ou qualquer outra obra cultural que tenha relação com o assunto em pauta. A primeira edição será publicada em 05/01/2009.
Mas claro que O Insensível também contará com posts diários sobre qualquer tema que eu, Marcelo Amaral, considere interessante. E os leitores podem fazer sugestões.
O blog terá um personagem. Trata-se de Henrique Couto, um apresentador de talk show. Henrique é, evidentemente, um entrevistador politicamente incorreto e insensível. Dirá coisas tipo "Você está muito gorda", "Sua roupa está amassada, além de ser brega" e "Você canta muito mal, só consegue espaço porque é filho de alguém famoso". Henrique Couto pode aparecer tanto nas edições especiais quanto nos posts diários.

Vale qualquer tipo de comentário em O Insensível. Pode ser furibundo. Pode ter palavrão. Não tem censura.



Marcelo Amaral